Maria Isabel Iorio
Não há nenhuma cidade onde eu não iria de ônibus atrás de você. Qualquer endereço em um envelope é um lugar onde estou botando meu casaco, chegando na sua frente. Se escrevo uma carta para a minha própria casa, o carteiro sabe que precisa passar na sua língua. Se compro frutas na quitanda da esquina suas mãos testaram as maçãs que escolhi com as minhas. Você tem oito anos a menos que eu, eu tenho oito anos a menos que você. Estou revisando todos os últimos anos da minha vida, dizendo a eles que você chegou. Mesmo que você sempre adormeça antes. Fico sozinha na cama, com trezentos cavalos que nunca adestrarei. Eles correm, com fúria e músculo, a noite inteira. Durmo com eles acordados, trabalhando, como um sistema respiratório. Você tem asma e precisa de uma máquina. Acorda no meio da noite, no meio dos cavalos. Eu marco um compromisso e pergunto, antes, se na sala cabem trezentos cavalos. Explico, que agora tenho esse tamanho. Mas às vezes alguns decidem não ir, estão com pulga, ficam na cama, correndo.
Maria Isabel Iorio é poeta e artista visual, autora de “Em que pensaria quando estivesse fugindo” (Urutau, 2016) e “Aos outros só atiro o meu corpo” (Urutau, 2019).